Prestes a completar seis meses, o governo de Jair Bolsonaro (PSL) tem um desafio na próxima terça-feira, 11: aprovar no Congresso o projeto de lei que autoriza o Executivo a emitir títulos do Tesouro Nacional no valor de até R$ 248 bilhões sem incorrer em crime de responsabilidade.
A proposta, se bem-sucedida, cria uma brecha na chamada "regra de ouro" do orçamento geral, dispositivo constitucional que impede que entes da federação (Governo, estados e municípios) contraiam empréstimo para pagar despesas correntes da administração pública.
Caso liberada pelo Congresso, a verba será empregada para sanar compromissos básicos, como Bolsa Família, Plano Safra e o Benefício de Prestação Continuada (BPC), voltado para idosos carentes. Sem o recurso, esses programas devem colapsar já a partir do dia 20 deste mês, afirma o secretário do Tesouro, Mansueto Almeida (leia entrevista na página 14).
Na Comissão Mista de Orçamento (CMO), onde a medida tramita na terça antes de ir a plenário no dia seguinte, o cenário é incerto, porém. Embora o deputado federal Hildo Rocha (MDB-MA), relator do projeto, tenha apresentado parecer favorável à proposta, preservando o pedido de R$ 248 bi do ministro Paulo Guedes (Economia), partidos do "centrão" e da oposição articulam-se para pressionar o Planalto.
A intenção é forçar o Governo a firmar compromisso com uma contrapartida antes de aprovar a permissão para que Bolsonaro descumpra a "regra de ouro", segundo relataram parlamentares ouvidos pelo O POVO.
Deputado federal e líder do PDT na Câmara, André Figueiredo avalia que, inicialmente, "não será fácil para o governo aprovar" a medida. Entre os fatores apontados, está a desorganização da base congressual. "Mesmo assim nós vamos trabalhar a possibilidade de aprovar" a solicitação, assegura o pedetista.
Há uma condição, todavia: que o Planalto ceda "à liberação de recursos para a educação, que foram cortados", indica. O parlamentar se refere ao contingenciamento de verba de custeio das universidades públicas brasileiras, anunciado pelo Ministério da Educação (MEC) no começo de maio. "Queremos que o governo se comprometa a recompor de imediato o orçamento da educação", avisou Figueiredo.
Colega de Casa e de partido, Eduardo Bismarck (PDT) concorda que, de forma geral, o presidente vai enfrentar "dificuldade de aprovar" a autorização para driblar a regra de ouro e garantir o pagamento de programas sociais.
"Talvez os deputados queiram um compromisso do Governo com segurança e educação", acrescenta. Para Bismarck, no entanto, o "clima é favorável" a Bolsonaro no Congresso. "(Os deputados) aprovam, mas vão tentar exigir alguma contrapartida."
Domingos Neto (PSD) tem opinião diferente. "Acho que não terá dificuldade para ser votado o projeto", responde o deputado federal, que é coordenador da bancada do Ceará na Câmara. Neto estima que o Planalto sairá vitorioso e que o Legislativo vai autorizar o valor integral. "O Governo disse R$ 146 bilhões e depois falou em R$ 248 bi, mas entendemos que o valor será global."
Cientista político, Uribam Xavier projeta obstáculos no caminho do bolsonarismo no debate sobre a permissão para extrapolar a regra de ouro. Segundo o pesquisador, o Planalto vai enfrentar resistência porque ainda não organizou uma base no Congresso. "Não há pessoas qualificadas no Governo para fazer articulação", analisa. "O líder do governo criou uma relação de antipatia com os deputados. A briga é pública."
Xavier adiciona um elemento que, conforme ele, tem ampliado a distância entre Executivo e Legislativo: a falta de um pacto claro para reger a relação entre os dois poderes. "O Bolsonaro inventou a nova política, sem toma lá, dá cá, mas não tem plano B para a formação de um grupo aliado para governar", sintetiza.
Congresso
Na mesma semana, Planalto tem desafio de aprovar projeto que autoriza brecha na regra de ouro para honrar pagamentos e garantir a manutenção do decreto das armas