Projetos de Lei na Câmara dos Deputados e no Senado pedem o fim do financiamento público de campanha. Na primeira eleição geral financiada com recursos públicos, cerca de R$ 1,7 bilhão foi dividido entre os partidos que disputaram a eleição de outubro do ano passado
Por: Alex Albuquerque
Em outubro de 2017, o deputado federal Henrique Fontana (PT) defendia a criação do Fundo Eleitoral para o financiamento das campanhas sob o argumento de que a medida "diminui o poder das empresas de intervirem nas eleições".
Questionado, o valor bilionário a ser repassado aos partidos chegou a ser alvo de setores da esquerda. O deputado federal Ivan Valente (PSOL-SP) declarou na época que "as pessoas se acostumaram a fazer campanha com milhões de financiamento privado e, agora, querem financiamento milionário público".
Pouco mais de um ano depois da sua criação, o Fundo voltou a ser questionado. Agora, quanto à sua capacidade de evitar corrupção.
Os argumentos em defesa de um financiamento público, na época, foram fortalecidos pelas denúncias de corrupção desvendadas pela Operação Lava Jato. As doações empresariais se transformaram em contrapartidas não republicanas entre o público e o privado. Na esteira das irregularidades no financiamento das campanhas, a existência de um Fundo Público poderia, de acordo com a maioria dos parlamentares, evitar a incidência do poder das empresas nas campanhas, reduzindo, assim, as possibilidades de corrupção.
Na primeira experiência de eleições gerais custeadas por um Fundo eleitoral e com doações de empresas proibidas, em 2018, surgiram, com maior ênfase, as candidaturas "laranjas", de fachada.
Diversos casos denunciados pela imprensa, nas últimas semanas, mostraram que a exigência do repasse de parte da receita para as candidaturas femininas foi o mecanismo encontrado para a "irregularidade da vez".
Fundo
As denúncias, que acabaram derrubando o primeiro ministro de Jair Bolsonaro, Gustavo Bebianno, movimentaram o Congresso Nacional. O cenário motivou o deputado federal Kim Kataguiri (DEM-SP) a protocolar Projeto de Lei para extinguir os fundos eleitorais e partidários.
Ao Diário do Nordeste, o parlamentar afirmou que "a extinção dos fundos partidário e eleitoral trará mais lisura ao financiamento eleitoral, evitando o desvio de verbas públicas". "Acredito que os partidos devem financiar sua estrutura tal como qualquer associação e/ou empresa privada. O dinheiro público deve ser destinado a áreas mais prioritárias", defende.
No Senado, Major Olímpio (PSL-SP) e Marcio Bittar (MDB-AC) protocolaram dois projetos que extinguem o Fundo Especial. Em pronunciamento de defesa do projeto, Bittar argumentou que o Fundo é um "confisco" do povo brasileiro.
"Está tirando dinheiro das pessoas mais humildes do Brasil para financiar campanhas. A criação do Fundo eleitoral atenta contra a independência do parlamentar porque o dinheiro vai para a Executiva Nacional, que acaba agindo com aqueles que são mais leais ou não, de acordo com os seus critérios", criticou.
Por outro lado, a senadora Kátia Abreu (PDT-TO) defendeu a verba para o gênero feminino e criticou os movimentos para a extinção do Fundo.
"O problema não é a cota, mas sim o que alguns coronéis da política fazem com ela. Estão se aproveitando de um direito adquirido pelas mulheres para lavarem dinheiro e criarem esse laranjal de candidaturas. É importante sim mantermos estímulos, como as cotas, para candidaturas femininas", escreveu na última sexta-feira (1°) no Twitter.
Modelo "ideal"
Especialistas em direito eleitoral consultados pelo Diário do Nordeste avaliam que a fiscalização pode ser mais incisiva nos gastos das campanhas. O crime, segundo eles, vai se aperfeiçoar seja qual for o modelo de financiamento.
O advogado Leonardo Vasconcelos defende mais transparência nos gastos. "Para burlar a legislação, pegaram esse dinheiro e colocaram nas candidaturas para fechar a cota, mas para beneficiar quem manda no Fundo", afirma o pesquisador.
Vasconcelos defende que o meio ideal deveria ser o financiamento misto, com participação das empresas. "Porque você não pode tirar da sociedade o direito de participar do processo político. O que se precisa é aumentar a transparência. Não podemos ser hipócritas de dizer que uma campanha não envolve dinheiro".
O professor de Direito Constitucional e Eleitoral do Damásio Educacional, Clever Vasconcelos, defende uma legislação para a divisão do recurso para todos os candidatos como forma de combate à corrupção nas campanhas. "O que seria razoável diante do modelo existente é que a lei, e não o estatuto partidário, determinasse o valor para cada candidato. Determinasse quanto cada candidato poderia repassar eventualmente para outro candidato do mesmo partido, e aí nós evitaríamos as candidaturas laranjas. O que está acontecendo é que os partidos políticos estão manipulando de forma inadequada o financiamento".
O professor, que é contra o financiamento público, defende o aumento do percentual de recursos privados para as candidaturas. Os valores, no entanto, teriam que ser fracionados entre vários nomes para evitar as candidaturas viabilizadas pelo setor financeiro. "A fiscalização, em termos de quem doou, é eficiente. O que é ineficiente é verificar como que se dá a repartição do valor dentro do partido político, que muitas vezes omite isso".
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