Especialista analisa a veracidade dessa conhecida expressão, considerando o impacto da ansiedade no ganho de peso
Na semana passada, quando eu voltava da Universidade de São Paulo (USP) de metrô para casa, ouvi duas mulheres conversando. Uma disse: “Eu tenho cabeça de gordo. Mal acabo de comer e já estou pensando na próxima refeição”.
Confesso que me interessei pelo bate-papo. Ou melhor, pelo vaivém dos assuntos. De um momento para o outro, o tema migrou da comida para a resposta que daria à mãe por causa de uma briga que tiveram. Aí voltou para a vontade de comer e, num instante, caiu em uma questão de trabalho com o chefe. Sim, eu bisbilhotei um pouquinho – mas repare como a conversa sempre abordava preocupações futuras.
Aqui começamos a entender como nós confundimos a sensação de fome com a ansiedade. Aliás, a região no cérebro que identifica a necessidade de ingerir alimentos é muito próxima da que processa a ansiedade.
Assim, é fácil interpretarmos a ansiedade como fome e vice-versa. E ambas essas sensações têm a ver com preocupações futuras (“eu precisarei comer” ou “terei que resolver os problemas com minha mãe e meu chefe”).
Para entender melhor, a ansiedade apareceu pra valer quando deixamos de nos preocupar apenas com o alimento que ingeriríamos naquele dia. Foi quando o ser humano aprendeu a cultivar alimentos agrícolas, em vez de caçar animais e coletar frutas que surgiam por aí.
Antes, o nômade vivia cada dia como se fosse o último. Ele não se preocupava muito com o futuro, porque precisava caçar quase todo dia. Já a plantação de vegetais e a criação de animais em cativeiro exige planejamento. Ou seja, demanda pensar no futuro e até tentar viver nele.
Claro que ninguém consegue “viver no futuro”, porém sempre tentamos fazer isso. Está aí um grande motivo de ansiedade, que é confundida com fome.
Voltando para minhas colegas de metrô, a tal “cabeça de gordo” descrita por elas nada mais é do que um exercício constante da mente humana. A gente simplesmente adora vagar por hipóteses futuras, como nossos ancestrais agricultores. Em outras palavras, não existe “cabeça de gordo”, e sim uma “cabeça moderna”.