Consta na denúncia que durante as diligências as delegadas da DCTD foram informadas que uma criança presenciava a abordagem e estaria chorando e vomitando ao presenciar cenas de tortura
A vítima, identificada apenas como Maria (nome fictício), foi abordada por inspetores da Especializada em casa. No local foram encontradas drogas. Ao invés de a adolescente ser levada até a delegacia responsável, ela ficou em poder dos policiais que exigiram mais drogas e dinheiro em troca da soltura da menor de idade, segundo o Ministério Público Estadual.
De acordo com seis promotores que assinam a denúncia, a diligência começou com intuito de capturar um alvo identificado como Francisco de Assis de Castro Braga, que seria membro da quadrilha do traficante Márcio Perdigão. Naquele 7 de junho de 2017, a expectativa da DCTD era apreender 25 quilos de drogas.
Os policiais saíram para a operação enquanto repassavam informações em tempo real em um grupo no Whatsapp, onde estavam as delegadas Patrícia Bezerra e Anna Cláudia Nery, gestoras da Delegacia. Em determinado momento, o inspetor-chefe Petrônio Jerônimo dos Santos, o 'Pepeu' enviou áudio no grupo dizendo que ele e Airton (José Airton Teles Filho, também inspetor), seguiam um veículo onde provavelmente estava o suspeito.
Patrícia chegou a questionar se o alvo da operação estava no carro, mas 'Pepeu' ainda não sabia. Minutos depois, o inspetor Madson Natan Santos da Silva mencionou no Whatsapp que no veículo estavam três homens e uma criança.
Às 15h17 é informado no grupo do aplicativo de mensagens que o carro deveria ser abordado. 15h23 começa a abordagem e minutos depois circulam áudios no grupo com choro da criança ao fundo, conforme denúncia do Gaeco
Madson pede que os colegas esperem porque "estamos trabalho o garoto", indicando que algo acontecia na abordagem. Segundo a acusação, a tortura fica evidente quando o inspetor Augusto (Walkley Augusto Cosmo dos Reis) envia uma mensagem privada a Pepeu e diz que a criança no carro "está chorando e vomitando". Em seguida ele ainda fala que: "Já foi muito saco", se referindo ao jargão que indica o uso de filmes plásticos para sufocação.
O PREÇO DA INFORMAÇÃO
Com a prática, os investigadores conseguem um endereço onde estaria Maria. Naquele momento, eles já tinham conhecimento que a menina detinha informações sobre esconderijo de mais drogas e armas. A adolescente é localizada e sequestrada.
Quinze caixas de maconha que teriam sido oferecidas como pagamento do resgate e garantia da liberdade de Maria foram formalmente apreendidas, junto com os ilícitos encontrados na casa em que a menor foi abordada. Procedimento lavrado pela delegada Anna Nery
As extorsões praticadas pelo grupo de inspetores eram rotineiras, conforme a denúncia do MPCE. A investigação do Grupo de Atuação Especial de Combate às Organizações Criminosas aponta que ainda em junho de 2017, os policiais Petrônio, Madson e Walkley se envolveram em um esquema onde exigiram R$ 1 milhão de um traficante para não prendê-lo. Depois, a exigência baixou para R$ 400 mil. A PF apreendeu cerca de R$ 300 mil na primeira fase da Operação Vereda Sombria, na casa de um dos investigados.
Os policiais localizaram e apreenderam mais de uma tonelada de maconha. Um suspeito identificado como Nickson Eliandro de Sousa Silva foi preso. O que agora é revelado na denúncia do MPCE é que além de Nickson, os inspetores encontraram outro suspeito em posse das drogas. O segundo traficante, identificado como 'Tenilson' foi abordado, mas liberado porque se comprometeu a recompensar os policiais.
Com isso, fica claro que Tenilson, apesar de abordado pelo equipe, como o próprio denunciado Petrônio referiu, quedou-se ileso da prisão, porque se comprometeu a dar aos policiais a importância a priori de 400 mil reais".
MPCE
Nesta sexta-feira (24), a reportagem entrou em contato com a Polícia Civil do Ceará solicitando saber se algum dos policiais denunciados foi afastado do cargo atual. Por nota, a PCCE se resumiu a responder "que não comenta apurações que seguem em segredo de Justiça".
Já o Sindicato dos Policiais Civis do Ceará (Sinpol/CE) disse ter protocolado pedido de acesso ao processo para tomar conhecimento dos fatos. Conforme o coordenador jurídico do Sindicato, Kaio Castro, até o fim da tarde dessa quarta-feira (22), eles não tinham conhecimento de nenhuma decisão judicial que tenha recebido ou não a denúncia do Ministério Público. "O que sabemos é que o processo se encontra em sigilo e até o presente momento não foi deferida a nossa habilitação e não temos como nos manifestar", disse.
A Assessoria Jurídica da Associação dos Delegados de Polícia do Ceará (Adepol), que faz a defesa das delegadas denunciadas, representada pelo advogado Leandro Vasques, disse que vai aguardar ter acesso aos autos para se pronunciar objetivamente sobre a denúncia. "Somente quando nossas constituintes forem citadas iremos rebater uma a uma as acusações. Acreditamos que um grave ruído de comunicação possa estar havendo. Para ficar num solitário exemplo: Interpretações elásticas de diálogos de WhatsApp são um convite ao fazimento de injustiças", disse Vasques, que completa "as delegadas denunciadas sempre pautaram suas ações na régua da estrita legalidade".
QUEM SÃO OS DENUNCIADOS E ONDE ELES ESTÃO ATUALMENTE:
Anderson Rodrigues da Costa, inspetor, Delegacia de Repressão às Ações Criminosas Organizadas (Draco)
André de Almeida Lubanco, escrivão, escrivão, 10º Distrito Policial
Anna Cláudia Nery da Silva, delegada, Delegacia de Defesa da Mulher de Fortaleza
Antônio Chaves Pinto Júnior, inspetor, Departamento de Recursos Humanos
Antônio Henrique Gomes de Araújo, inspetor, Departamento de Recursos Humanos
Antônio Márcio do Nascimento Maciel, inspetor, Departamento de Informática
Cristiano Soares Duarte, inspetor, 12º Distrito Policial
Edenias Silva da Costa Filho, inspetor, Delegacia de Roubos e Furtos (DRF)
Eliezer Moreira Batista, inspetor, Gabinete da Superintendência da Polícia Civil
Fábio Oliveira Benevides, inspetor, Departamento de Recursos Humanos
Fabrício Dantas Alexandre, inspetor, Departamento de Polícia Judiciária Especializada
Francisco Antônio Duarte, recolhido no Centro de Triagem e Observação Criminológica (CTOC) *(não é policial)
Francisco Alex de Souza Teles, inspetor, Departamento de Recursos Humanos
Gleidson da Costa Ferreira, inspetor, Departamento de Polícia Judiciária Especializada
Harpley Ribeiro Maciel, inspetor, 5º Distrito Policial
Ivan Ferreira da Silva Júnior, inspetor, 8ª Delegacia do Departamento de Homicídios e Proteção à Pessoa (DHPP)
João Filipe de Araújo Sampaio Leite, delegado do Piauí, ex-inspetor da PCCE.
José Abdon Gonçalves Filho, recolhido no Centro de Triagem e Observação Criminológica (CTOC) *(não é policial)
José Airton Teles Filho, inspetor, Delegacia de Roubos e Furtos de Veículos e Cargas (DRFVC)
José Amilton Pereira Monteiro, inspetor, 8º Distrito Policial
José Audízio Soares Júnior, inspetor, Departamento de Gestão de Pessoas
José Ricardo do Nascimento, recolhido no Centro de Execução Penal e Integração Social Vasco Damasceno Weyne (Cepis) *(não é policial)
Karlos Ribeiro Filho, inspetor, Delegacia de Roubos e Furtos de Veículos e Cargas (DRFVC)
Madson Natan Santos da Silva, inspetor, Coordenadoria de Operações e Recursos Especiais
Marcos Vinícos Alexandre Gonçalves, em liberdade endereço não confirmado *não é policial
Patrícia Bezerra de Souza Dias Branco, delegada, Assessoria Jurídica da Polícia Civil do Ceará
Petrônio Jerônimo dos Santos, inspetor, Departamento de Gestão de Pessoas
Rafael de Oliveira Domingues, inspetor, Departamento de Gestão de Pessoas
Raimundo Nonato Nogueira Júnior, inspetor, Departamento de Gestão de Pessoas
Thiago Morais da Silva, em liberdade endereço não confirmado *(não é policial)
Walkley Augusto Cosmo dos Reis, inspetor, Delegacia de Roubos e Furtos (DRF)
Weverton Moreira de Brito, recolhido na Casa de Albergado de Fortaleza *(não é policial)
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