EM EVENTO COM INDUSTRIAIS, PRESIDENTE JAIR BOLSONARO CRITICA COMBATE AO TRABALHO ESCRAVO

Presidente usou caso ocorrido no Ceará para ironizar combate feito pelo Ministério Público do Trabalho.


O  presidente Jair Bolsonaro (PL), nesta terça-feira (7), criticou o Ministério Público do Trabalho (MPT) por combater o trabalho escravo. Em evento organizado pela Confederação Nacional da Indústria (CNI), Bolsonaro mencionou especificamente uma ação do MPT no interior do Ceará.

“Meteram a caneta no cara", disse Bolsonaro. O caso, segundo o próprio presidente, seria de um fazendeiro da área de extração de carnaúba com quem ele teria conversado por telefone "há pouco" e que não oferecia banheiro, dormitório ou local adequado para comer aos trabalhadores. Essa mesma história, porém, já havia sido contada pelo presidente em 2019.

De acordo com uma matéria produzida em agosto daquele ano pela Organização Não Governamental (ONG) Repórter Brasil, Bolsonaro, naquela época, também citou em público o caso de um fazendeiro de extração de carnaúba no Ceará que teria recebido uma "tremenda de uma multa" por não oferecer banheiro químico aos trabalhadores.

HISTÓRIA DO FAZENDEIRO

Segundo o portal Metrópoles, Bolsonaro contou nesta terça (7) que recebeu um telefonema no Palácio do Planalto de um fazendeiro cearense que havia sido multado por expor trabalhadores ao trabalho escravo. 

“Há pouco, um telefonema do interior do Ceará. Um ‘cabra’ que ligou para alguém da Presidência, que passou o telefone para mim: ‘Acabei de ser multado aqui, eu estava com meu pessoal colhendo folha de carnaúba. Chegou o MP do Trabalho e largou meia dúzia de multas em cima de mim”, relatou o presidente. 

Bolsonaro continuou narrando o "diálogo": “Multou por quê?”. “Porque não tenho banheiro químico. Estou a 45 graus e obviamente não tenho banheiro químico”, teria respondido o infrator, segundo o próprio presidente.  

“O cara vai deixar de colher a folha ali, andar 500 metros, fazer um xixi e voltar? Meteram a caneta no cara. Também uma mesinha feita de forma rústica, com madeira da região, para servir o almoço. Não estava adequada aquela mesa. Também a questão do dormitório, o pessoal dormia em uma barraca. Multa em cima dele”, continuou. 

À época da primeira história, a ONG Repórter Brasil investigou e chegou ao nome de Benedito Monteiro dos Santos Filho, ex-prefeito de Itarema, no interior do Ceará, que estava na "lista suja" de empregadores que exploravam mão-de-obra análoga à escravidão. Ele foi autuado pelo MPT-CE por não disponibilizar banheiro para os trabalhadores, além de empregados sem carteira assinada.

Bolsonarista, o ex-prefeito disse, à època, à Repórter Brasil, que não sabia se o presidente estava se referindo à sua história, mas afirmou que tinha acionado políticos influentes no Estado para pedir ajuda nacional.

“ATRAPALHAVAM A VIDA DE VOCÊS” 

No evento, ainda segundo o Metrópoles, Bolsonaro chegou a afirmar que o combate feito pelo MPT para evitar que trabalhadores sejam explorados em condições sub-humanas, análogas ao trabalho escravo, atrapalha a vida dos empresários. 

“Olha as normas regulamentadoras, como era difícil ser um grande empresário, empregador, com aquelas NRs. O Marinho [Rogério Marinho, ministro do Desenvolvimento Regional] fez uma limpa naquilo. A altura da pia, maciez do papel higiênico, tudo isso era motivo de multa. Ele [Marinho] acabou com milhares de itens que atrapalhavam a vida de vocês”, disse o presidente diante de empresários e integrantes do Governo. 

INFORMAÇÕES ENVIESADAS

Para Italvar Medina, vice-coordenador nacional da Coordenadoria Nacional de Erradicação do Trabalho Escravo e Enfrentamento ao Tráfico de Pessoas (Conaete) do MPT, a fala de Bolsonaro revela "desconhecimento do conceito de trabalho escravo".

Além disso, acrescenta o procurador, a afirmação do presidente não foi baseada "nos próprios relatórios de fiscalização, mas em informações enviesadas prestadas pelos próprios criminosos que foram flagrados com essa prática".

CRIME PREVISTO EM LEI

Medina lembra ainda que o combate ao trabalho escravo é integrado com o Ministério Público Federal (MPF), a Defensoria Pública da União (DPU) e a Polícia Federal (PF) e que a configuração do crime está descrita no artigo 149 do Código Penal.

O trecho da lei penaliza quem submeter alguém a condições análogas à de escravo, seja submetendo a trabalho forçado, jornada exaustiva, condições degradantes de trabalho ou restringindo sua locomoção em razão de dívida contraída com o empregador.

"Vale destacar também que o combate ao trabalho escravo contemporâneo é imprescindível para a própria boa imagem do País nas suas relações internacionais, já que muitos países estão se negando a adquirir produtos de empresas cujas cadeias produtivas estejam contaminadas pela exploração", concluiu Medina.



Nenhum comentário:

Postar um comentário