MAGISTRADAS DEFENDEM TRABALHO A PARTIR DOS 14 ANOS PARA LIVRAR JOVENS DO TRÁFICO

Acesso mais cedo a renda lícita reduziria interesse pela participação no tráfico de drogas, ato infracional mais cometido por adolescentes em BH no ano passado, apostam autoridades da Vara da Infância e da Juventude. Lei atual permite contratação aos 16 anos

Por: Alex Albuquerque


As magistradas da Vara da Infância e da Juventude de Belo Horizonte Valéria Rodrigues Queiroz e Riza Aparecida Nery defenderam o trabalho de adolescentes a partir de 14 anos como forma de barrar a entrada deles no tráfico de drogas. A participação no tráfico liderou os atos infracionais cometidos por menores entre os 12 e os 18 anos de idade em 2018 e ficou também entre as modalidades que mais cresceram na comparação com 2017, de acordo com relatório anual apresentado ontem no Centro Integrado de tendimento ao Adolescente Autor de Ato Infracional (CIA).  “Nos causa preocupação.  “Nos causa preocupação. Temos feito vários programas para tentar reduzir esse problema. Vemos que precisamos de escola e ocupação para essas crianças, que entram no tráfico sobretudo pelo dinheiro fácil. Ouço crianças dizendo que recebem R$ 100 por dia para o tráfico. Elas vêm de famílias pobres, precisam do dinheiro”, afirma a juíza Riza.essas crianças, que entram no tráfico sobretudo pelo dinheiro fácil. Ouço crianças dizendo que recebem R$ 100 por dia para o tráfico. Elas vêm de famílias pobres, precisam do dinheiro”, afirma a juíza Riza.

O documento aponta para redução no conjunto das infrações. O relatório registrou queda de 5,63% nos atos infracionais cometidos por adolescentes na capital, passando de 6.001 em 2017 para 5.663 em 2018. O número de jovens apreendidos em flagrante passou de 10,2 mil, em 2008, para 7 mil, em 2018. “Tivemos uma queda considerável no número de infrações”, afirmou a desembargadora Valéria Rodrigues. Ela atribuiu a queda à celeridade no processo de julgamento.





Em direção contrária à queda no conjunto, foram registrados aumentos nos atos infracionais relacionados ao tráfico de drogas, homicídios, pichação e estupro de vulnerável. Em 2017, menores com idade entre 12 e 18 anos incompletos foram autores de 12 homicídios, que passaram para 14 em 2018, um aumento 16,67%. O crescimento de casos de estupro de vulnerável foi de 137,50%, passando de oito em 2017 para 19 em 2018. Os casos de pichação subiram de 23 para 28, com uma alta de 21,74%.


Os atos relacionados ao tráfico ficaram no topo do ranking das infrações, passando de 1.710, em 2017, para 1.910 em 2018, um aumento de 11,70%.  “Atribuo o tráfico de drogas à falta de oportunidade, principalmente de trabalho para essa geração atual de adolescentes”, afirma a desembargadora Valéria Rodrigues Queiroz, superintendente da coordenadoria da infância e da juventude. Ela defendeu que a legislação permita que eles trabalhem mais cedo. “Pelas leis trabalhistas, os adolescentes só podem trabalhar a partir dos 16 anos. A meu ver é uma idade que tem que ser revista. O adolescente tem que ajudar em casa”, completou. Para ela, o tráfico de drogas tem sido “a única firma” a oferecer oportunidade para esses jovens.

O relatório traça perfil dos jovens que cometem os atos infracionais na capital mineira. A maior parte dos atos infracionais é cometida por adolescentes do sexo masculino, com idades entre 15 e 17 anos. Em sua maioria, eles vêm das regionais Nordeste, Venda Nova e Leste. Parte dos adolescentes (13,58%) reside em municípios da região metropolitana. “É fruto da ausência do Estado nesses locais. Percebemos ausência de política nesses locais para que não haja o cometimento dos atos infracionais. Não atribuo ao lugar e sim à ausência do Estado”, afirma a desembargadora
De acordo com a desembargadora, nem mesmo a escola acolhe corretamente esses adolescentes, que terminariam sendo forçados a abandonar os estudos. “Os adolescentes não abandonam as escolas. Eles são excluídos. Têm vários desestímulos para permanecerem em sala de aula”, afirma.
Valéria Rodrigues destacou ainda a maneira como está organizado o Centro Integrado de Atendimento ao Adolescente Autor de Ato Infracional (CIA), com a presença da Polícia Militar, Polícia Civil, Defensoria Pública e Vara da Infância, o que permite que os adolescentes apreendidos cometendo atos infracionais possam ser julgados em menos de 45 dias. “A queda se deve à celeridade. Ocorre apreensão pela PM, aqui já é lavrada a ocorrência. No mesmo dia, é realizada uma audiência preliminar com juiz e defensor público”, afirma a juíza.

O relatório é publicado pela Vara da Infância há 10 anos com o objetivo de demonstrar que não há impunidade para menores que cometem atos infracionais. “O objetivo maior é quebrar o mito de impunidade, de que não acontece nada com o menor”, afirma a desembargadora. O Estatuto da Criança e do Adolescente (ECA) prevê diferentes penas para os adolescentes infratores, a partir de 14 anos, que cometam atos infracionais: advertências, prestação de serviço à comunidade, internação assistida e internação.


MAIORIDADE PENAL A juíza Riza Aparecida Nery se posicionou contrária à redução da maioridade penal. De acordo com ela, o percentual de reincidência vem se reduzindo. “A reincidência ocorre muito quando a criança chega bem nova, com 14 anos. Elas costumam voltar. Mas a partir dos 17 anos, quando é o primeiro ato infracional, o adolescente não retorna. O número é muito pequeno. Isso explica o nosso ponto de vista de ser contrário à redução da maioridade penal”. A Vara da Infância tem apostado na “justiça restaurativa” para ressocializar esse jovem.  “Trazemos a mãe e o pai para o problema do menor.

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